quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Eu, Pai Natal! Parte III


Dia 24 de Dezembro, 21h e 15 min, lá fora estão menos dez graus Celcius, e a neve não para de dar um ar da sua graça, para além de estar uma ventania descomunal. Prevê-se uma longa e difícil viagem, mas a vontade que me move anula qualquer adversidade com que me depararei no caminho.
Está todo a postos… vamos lá dar inicio à viagem, rena voadora. O orfanato do José, de nome “casa do afeto” situa-se em St Petersburgo, temos muitos km por percorrer, mas certamente chegaremos lá antes da meia-noite.
No caminho ultrapassamos várias tempestades, e eu quase congelei. Mas, era meia-noite menos um quarto e já avistava um edifício com as paredes cobertas de tijolos, janelas altas, portões grandes, chaminé estreita de alumínio e um pequeno jardim com todo o tipo de brinquedos. Gritei num tom alucinante “CHEGAMOS! CHEGAMOS!”, pois aquele edifício era o destino pretendido, o orfanato.
Após ultrapassar o primeiro desafio, avizinha-se o próximo, como entrar sorrateiramente na casa do afeto, na medida em que estava tudo bem vedado para manter a segurança de todas as crianças, e a chaminé é tão estreita que nem a ponta do meu dedo mindinho lá consegue entrar.
 Nos entretantos avistei uma janela, nas traseiras da casa aberta, avancei o muro e lá consegui entrar. Aquela janela dava para a cozinha, ao entrar assustei a Dona Juvelina, a cozinheira de serviço. Mal me avistou teve uma quebra de tensão, pois eu nunca me mostrei a ninguém, aliás escolho sempre as horas em que as criancinhas estão a dormir para entregar as prendas.  
Após a senhora vir a si expliquei a situação que me levava lá e perguntei pelo José, ao que ela me respondeu: “Ele já se fora deitar, é um menino muito solitário, que necessita de muita atenção. Nós aqui com mais de 100 crianças não conseguimos-lhe dar esse carinho”, em seguida, atenciosamente pedi para me encaminhar até ao quarto do menino.
Confesso estava nervoso, abri a porta com cuidado e deparo-me com um menino mulato, magrinho, deitado na cama de barriga para baixo com uma foto de um casal (detetei logo que eram os pais) com o rosto coberto em lágrimas. Tão absorvido na fotografia nem deu pela minha entrada, sentei-me na beira da cama e deixei pronunciar, quase que a medo um “Olá José”. O menino olhou para mim, saltou da cama e abraçou-me como nunca ninguém me tinha abraçado antes, esse foi o melhor agradecimento que poderia ter tido!
Entre varias conversas, falamos da foto que ele observara, eram os seus pais que tinham perdido a vida num acidente à poucos meses atrás, e foi isso que o levou até lá. Claro que não consegui substituir a falta que aqueles dois seres tão importantes lhe faziam, mas sei que o tempo que passamos juntos lhe afastou essa dor.
Depois de tanta brincadeira, já o José dormia. Levantei-me e regressei a casa com o coração cheio.
Nos restantes natais, jamais vou oferecer bens materiais, pois não a nada mais importante que um abraço. Este foi o melhor natal da minha vida!

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